top of page

A TURMA DA "ARVINHA"



Imaginava o encontro desta tarde. Uma nota de 10 reais mais algumas moedinhas sobre a mesa financiariam a festa de hoje. A casa era humilde e modesta. Típica de edificações mais populares, construída próxima ao Cristo do Redentor. A residente: uma figura muito conhecida no Vale do Redentor, na cidade de São José do Rio Pardo, próxima ao sul de Minas. Simpática e de aparência simples, era de fácil entrosamento com todos. Tinha até um apelido para os íntimos, mas também, ouvia-se de todas as bocas: – Lá vem a Toninha Cascavel.


Preparada, saia para encontrar seus amigos, que a esperavam ansiosos debaixo de uma pequena árvore na praça.


O caminho é curto, entre ladeiras e morros que desenham e definem a paisagem. Crianças ocupam a rua em carrinhos de rolimã, na disputa entre quem vai ficar com o primeiro lugar, enquanto também se preocupam com os carros que transitam de vez em quando, impedindo que continuem. A molecadinha ficava animada quando era possível ter uma partida de futebol no campo, o que não era fácil, já que o local estava desorganizado e sem reparos, porém, nada que fosse fora do comum. E lá jogavam. Nos quarteirões, da varanda ou na calçada, observadores tranquilos após um longo dia perdido no desenvolvimento do trabalho cotidiano. São aqueles que gostam, em seu ócio particular, de discutir a vida alheia de passagem.


Surgia no início da rua a mulher, a Toninha, já com sua garrafa nas mãos. Os olhares de foram direcionados a ela de maneira duvidosa e superior.


– Lá vai Toninha Cascavel novamente beber. Novamente fazer bagunça e arrumar confusão, cochichavam.


Ela não se importava. Estava apressada. Queria logo mais chegar a seu destino.


– Toninha, aonde você vai? pergunta um homem já sabendo a resposta que ela daria.


– Ora, estou indo até meus colegas da arvinha. Ela falava da arvorezinha que, num futuro próximo, daria origem a outros sonhos e ideais.


Chegara ao seu destino. A garrafa que segurava já estava com o líquido pela metade. Em tão pouco tempo, teria bebido metade do conteúdo ou foi desperdiçado na trajetória? Bobagem pensar nisso agora...a vontade maior era o reencontro. Havia muito mais com os outros, e não só o conteúdo de uma garrafa, mas o conteúdo humano.


A árvore descrita, especial. Simbolizava a atitude daquelas pessoas e das futuras gerações. A amizade. Um a um, Toninha os reconhecia, todos debruçados sob o pé do monumento.


– Olha lá meus amigos da arvinha, gritava exultante.


– Toninha chegou…, anunciava Brinquinho, sempre nessas ocasiões. Mais uma das personalidades irreverentes do Vale do Redentor. Integrante da farra.


– Eh Brinquinho, hoje chegou primeiro que eu, pensei que tivesse caído por aí, dizia a Cascavel com um ar de sarcasmo, talvez por esse motivo tivessem dado o apelido a ela. Mas sem discussões ou brigas, começavam a tão animada festa. A diversão de poucos. E alegravam a vizinhança. Mesmo que alguns fossem contra, se envolviam de longe, em suas casas, em tão mágico evento. Bebida, brincadeiras, dança, comida, tudo pago com o pouco dinheiro que angariavam entre eles.


Fim. A noite terminava e cada um seguia de volta para sua casa. Parecia folclórico. Um conto. Ficava na memória do Vale. Fariam novamente. A única representação de que ali passaram são as garrafas e as latinhas vazias deixadas. Só um reflexo. Uma ilustração.


Um dia, eles desapareceram. A árvore foi abandonada. Um espaço que não pôde mais ser compartilhado entre Toninha, Brinquinho e seus colegas. Um vazio foi deixado. Perdeu-se o colorido. Por algum tempo…


Anos mais tarde, jovens construiriam a ideia de uma nova turma. Renovada. Atual. Reflexo de Toninha e Brinquinho quando o assunto era euforia, felicidade, festa e animação. Garotos que iniciariam uma comunidade diferente e extraordinária. Os personagens de muito tempo, às vezes oprimidos e inferiorizados pela sociedade, só queriam estar juntos, como irmãos. Amigos. Os novos aprenderam a lição. Continuaram o legado de seres singelos e felizes. Uma conquista: a Turma da Arvinha do Vale do Redentor.


A Turma da Arvinha do Vale do Redentor


Idealizada por Leonardo Duarte (Léo), Marcola, Marcelinho Japa, Marcelo Souza, Marcos Ferreira, Roni Ferreira e Zinho, a Turma da Arvinha se originou em 2006, em São José do Rio Pardo (SP), com o objetivo de curtir o carnaval e fazer reuniões para animar os moradores do Vale. “Nós fundamos o bloco Turma da Arvinha. Sempre, nos carnavais, fazíamos uma reunião e nos divertíamos. Com o tempo, as pessoas foram nos conhecendo pela nossa animação. Foi daí que relacionaram aqueles que ficavam debaixo da árvore com a gente. ”, diz Léo Duarte, 31, um dos integrantes ativos.


Com o tempo, novos membros aderiram ao bloco. Hoje, a maioria em atuação: Caio Edward, Filipe Bill, Filipe Silvério, Ricardo de Moura (Rick) e o Rick Pezão. Nos primeiros anos do projeto, os integrantes tiveram dificuldades para produzir os abadás usados no carnaval. Segundo Caio Edward (27), diretor da organização a partir de 2008, com a participação de mais de 100 pessoas nos encontros, foi necessário buscar apoio para elaborar as camisetas e organizar o evento carnavalesco: “No começo, cada um pagava seu abadá. Logo, o bloco cresceu graças à animação e o barulho, nossos diferenciais até hoje. Então pensamos em trazer ideias diferentes para os participantes. ”


O bloco também possui um símbolo de quem são e o que fazem: “No início, nosso logo era uma árvore, com um homem sentado sob ela. Em 2009, passou a ser só uma árvore com o design animado “, explica Léo.

Atualmente, o carnaval da Arvinha reúne mais de 1000 pessoas por ano, além daqueles que não estão incluídos no abadá. “Esse ano quase ficamos sem carnaval aqui em São José do Rio Pardo. Então como sempre, nos juntamos, e conseguimos marcar um evento nas imediações do Cristo do Redentor. Ficou muito bem organizado e atraiu muita gente. “, conta Caio.


Projetos Sociais e a Associação de Amigos do Vale do Redentor

O Carnaval não é a única marca registrada. Após a consolidação e divulgação da Turma da Arvinha, os integrantes começaram a desenvolver ações sociais em prol da comunidade do bairro Vale do Redentor. Ricardo de Moura, também diretor do bloco, relata que os projetos nasceram da ideia de fazer a diferença e ajudar as pessoas. “Tudo começou pela vontade de reunir amigos para curtir o carnaval, mas ao longo do tempo isso foi mudando e sentimos a necessidade de fazer algo a mais. Começamos a ajudar a comunidade com a arrecadação de alimentos e começamos a desvincular o nome da Arvinha só ao Carnaval. Com isso, conseguimos trazer um público diferente, como crianças e idosos.”

Ações sociais para as crianças e adolescentes também foram criados como uma forma de relembrar as brincadeiras que aconteciam na época em que os membros eram mais novos, típica do lugar onde eles moram. “Aí surgiu o carrinho de rolimã, o tacobol, e até no kart nos envolvemos. Hoje, temos O GP de carrinho de Rolimã e campeonatos de Tacobol.”, fala de forma entusiasmada o Rick.

Em 2015, junto com Maria Adalgisa Máximo, a Dal, o grupo decidiu criar a Associação de Amigos do Vale do Redentor (AAVR), que visa reforçar os projetos sociais da Turma da Arvinha perante a comunidade e colaborar para o bem-estar do Vale. “Com essa associação, pretendemos realizar atividades como: capoeira, judô, natação… Aulas no intuito de tirar a garotada da rua e promover uma sociedade melhor.”, finaliza Caio.


SOBRE:

Pindorama é a designação de um local mítico dos povos tupis-guaranis, que seria uma terra livre dos males. Foi também o primeiro nome atribuído ao Brasil pelos índios, antes da descoberta. Por analogia, um blog de Jornalismo Cultural seria “um espaço livre dos males”, um território onde a literatura e as artes encontram um terreno fértil para frutificar. Aqui você encontra a produção dos alunos do 6º Semestre de Jornalismo da UNIFAE, que estão construindo um blog coletivo, sob coordenação da Profª. Carmem Aliende.

Os alunos foram desafiados a produzir textos literários, críticas, resenhas, matérias e perfis relacionados  ao universo cultural, em suas várias vertentes - cinema, teatro, artes plásticas, dança, música, moda, literatura, gastronomia, etc. Entre os principais objetivos da atividade estão vivenciar a construção coletiva de um blog, percebendo suas peculiaridades e possibilidades de atuação profissional; aproveitar o potencial dos alunos que já têm alguma produção autoral para trocar experiências e motivar os demais; e criar formas de interação com o público.

 POSTS recentes: 
 procurar por TAGS: 
Nenhum tag.
bottom of page